Em 2009, apesar de estarmos no auge de uma crise económica muito severa, o setor do turismo, que já se vinha a afirmar, conseguiu consolidar-se em Portugal. A melhoria do parque hoteleiro, associada a uma proliferação das companhias aéreas low-cost e uma cada vez maior diversificação da oferta conduziu a números neste setor que todos os anos eram superados em relação ao ano anterior. Da mesma forma, questões de instabilidade em países como o Egipto e a Tunísia trouxeram novamente mercados em força (como o francês ou italiano), que já não tinham a expressão de outrora.
Ao longo dos últimos anos, foram numerosos os prémios mundiais relativos ao turismo que Portugal conseguiu arrecadar. Porém, assistiu-se a um boom turístico na última década, muitas vezes de forma desenfreada e descontrolada. Mais, o turismo que deveria trazer valor acrescentado aos portugueses, muitas vezes está a acarretar sobrecarga dos locais mais visitados, com prejuízos para as populações residentes, que veem inflacionados o acesso a bens e serviços (desde as compras diárias, passando pelos preços das habitações, até ao estacionamento, entre outros). Na verdade, 70% do turismo está concentrado no Algarve, Lisboa e Madeira e 90% no litoral de Portugal Continental. Vários destinos em Portugal têm cada vez mais turistas, estando a caminho da massificação, como em S. Miguel (Açores), Coimbra, Évora, Batalha, entre outros.
É também através do turismo e dos seus players que Portugal se consegue projetar para o mundo. Quem nos visita procura a nossa cultura, história, paisagens, ambiente natural e construído, em suma, o nosso património material e imaterial. Mas é preciso que os portugueses se sintam parte integrante do processo turístico e que os lucros obtidos não sirvam apenas para engordar os grandes grupos económicos (exclusivos do setor ou não).
Contudo, sendo este um setor muito apetecível, foram surgindo atividades paralelas, que muitas vezes oferecem serviços de qualidade duvidosa, e como frequentemente não pagam impostos, oferecem preços mais baixos, acabando por atrair algumas pessoas e transmitindo uma má imagem da qualidade turística portuguesa. Falamos, por exemplo, de organizadores de viagens sem licenciamento, guias sem formação ou alojamento paralelo, entre outros.
A crise provocada pela COVID-19 trouxe uma queda abrupta no crescimento deste setor, expondo as debilidades que já existiam, mas que, quando o setor é pujante, são abafadas. Entre outras questões, falamos da questão laboral, em que os trabalhadores do setor têm vínculos precários para funções permanentes (contratos a termo incerto, “recibos verdes”). Muitas destas pessoas foram simplesmente descartadas, por não mais serem necessárias, sendo que muitas vezes não têm direito a qualquer apoio social. Da mesma forma, o Plano de Recuperação e Resiliência não tem previsto apoio algum para o setor do turismo. Quem mais sofre com isto são os pequenos empresários, que se veem a braços com elevados custos fixos e sem clientes.
Desta forma, urge repensar este setor e perceber o turismo que queremos para o nosso país. Um turismo onde as populações consigam “colher frutos”, onde exista investimento, mas também proteção laboral e proteção da identidade coletiva e, claro, a valorização sustentável do nosso património natural e cultural.
Assim, o Partido Ecologista os Verdes, reunido na sua 15ª Convenção, propõe:
1. Dignificar as profissões do setor do turismo, através da formação de base, valorizando o ensino profissional e superior, para preparação de profissionais devidamente qualificados, mas também através da criação de carreiras remuneratórias dignas e justas, garantindo uma fiscalização aos vínculos precários. É, ainda, importante, incrementar a formação contínua, como forma de valorização constante dos recursos humanos.
2. Repensar a estratégia turística do país ao nível do ordenamento do território, tendo em conta a sua capacidade de carga. Para o efeito, é importante equacionar a necessidade de implementar medidas concretas, como a limitação do número de visitantes ou a viabilidade de novas construções.
3. Refletir sobre uma necessidade de limitação de emissão de alvarás para estabelecimentos de alojamento, sobretudo os de alojamento local, que muitas vezes, além de se levantarem questões relativas à sua qualidade, são um eixo de gentrificação que descaracteriza os territórios e conduz à perda da identidade própria dos locais.
4. Apoiar os investidores, sobretudo os pequenos empresários, com redes de negócios que simultaneamente estimulem a economia nacional, com produtos portugueses, que dignificam e caracterizam o país.
5. Combater a atividade paralela no setor do turismo, seja por via de maior fiscalização das entidades competentes, seja por via de campanhas de sensibilização ao turista para a escolha de prestadores de serviços que cumpram os trâmites legais (emissão de fatura, certificações profissionais, entre outros).
6. Limitar o acesso dos grandes grupos económicos internacionais, que buscam o lucro fácil, e que não trazem valor acrescentado à economia portuguesa.
7. Consolidar a legislação sobre áreas protegidas, reforçando-as e limitando as condições de acesso a visitantes sem acompanhamento profissional.
8. Apostar na requalificação e valorização de património edificado.
9. Afirmar o território Português como um todo, em detrimento dos grandes polos de concentração turística.
10. Criar roteiros turísticos inclusivos.
11. Reforçar a rede de transportes públicos nacionais e regionais, de forma a combater o excesso de viaturas particulares nos centros históricos e/ou áreas de natureza sensível.
Lisboa, 22 de maio de 2021