Intervenção de Abertura
Mariana Silva, Dirigente Nacional do PEV:
Saúdo todos os delegados aqui presentes para participar na 16.ª Convenção do nosso Partido, saudando, neles, todos os que ao longo destas mais de 4 décadas, ergueram esta força de luta ecologista.
Saúdo a presença dos convidados que acolheram o nosso convite e que vão acompanhar os trabalhos. Sejam muito bem vindos.
Agradecemos ao Município de Setúbal que se disponibilizou para ceder a sala do Cinema Charlot para receber a 16.ª Convenção dos Verdes. Agradecer, igualmente, ao Presidente da Câmara Municipal André Martins, histórico dirigente dos Verdes que, com a CDU, concretizam todos os dias o compromisso que temos com as pessoas deste País, um compromisso pelas condições de vida das populações, os seus direitos e a sua felicidade, com a natureza e a sua conservação, com o bem-estar animal.
Agradecemos aos trabalhadores do Cinema Charlot, toda a ajuda para a realização da Convenção.
Por último, permitam-me saudar e agradecer em particular a todos aqueles que trabalharam arduamente durante longos meses para que fosse possível encontrarmo-nos aqui dois dias a conversar, a conviver, a debater, a refletir sobre o que pretendemos do nosso trabalho para o futuro.
Muito obrigado a todas e a todos.
A 16.ª Convenção do Partido Ecologista Os Verdes acontece num momento muito exigente, quer a nível nacional, quer a nível mundial. Estamos nos últimos anos a viver momentos de incerteza e de viragem que não nos descansam.
Muitas foram as dificuldades que se apresentaram e apresentam mas que, tal como no passado, estamos a enfrentar de forma determinada.
Não ignoramos que muita coisa mudou para o Partido Ecologista Os Verdes.
Perdemos o Grupo Parlamentar nas Eleições Legislativas de 2022, mas como todos sabemos tão bem, não baixámos os braços. Continuámos um trabalho de proximidade com as populações, com a valorização dos eleitos locais. Nunca abandonámos nenhuma das lutas iniciadas, não virámos as costas às que se apresentaram após esta saída.
Também em 2022, em Dezembro, festejamos os 40 anos dos Verdes e quando olhamos para trás, quando somos chamados a fazer balanços do trabalho feito, das conquistas, das lutas, dos momentos em coletivo, percebemos que muito se fez e que apesar disso o caminho continua apresentar-se longo.
Quem não se lembra das lutas contra o Nuclear ou as bandeiras negras colocadas na Costa Portuguesa contra a passagem de navios com plutónio?
Quem não se recorda da Campanha «STOP às Alterações Climáticas – Toca a Agir» quando levamos para as ruas em todo o País com a audácia que nos era exigida num tempo em que eramos tomados por loucos.
As inúmeras campanhas pela defesa de uma Floresta autóctone, resiliente e contra a monocultura de eucaliptos.
Foram inúmeras as iniciativas, as lutas, as propostas legislativas nas mais diversas áreas. Ao longo destes 40 anos de trabalho fomos sempre capazes de olhar para as questões como um todo e não como temas fragmentados, a justiça ambiental depende e muito da justiça social.
Desde sempre Os Verdes empenharam-se para que se olhasse para as questões ambientais como sendo parte integrante de todas as outras áreas, abordagem que é ainda mais permenete nos nossos dias. Não podemos permitir que se continue a desligar as respostas aos problemas ambientais dos problemas que estão diretamente ligados à sobrevivência das pessoas.
É cada vez maior o número de pessoas que vive na pobreza e na extrema pobreza, que não consegue ter uma vida digna, mesmo trabalhando ou tendo trabalhado uma vida inteira.
Portugal tem, segundo a Pordata, 2,1 milhões de pobres. O número de pessoas pobres cresce a cada dia que passa, por isso, continuamos a defender os aumentos dos salários e das pensões, para que todas as pessoas sejam tratadas com respeito, igualdade e liberdade, protegidas nos seus direitos independentemente de características pessoais, com direito a uma vida digna.
Melhorar as condições de vida irá repercutir-se numa maior preocupação com as questões ambientais, com os produtos que escolhemos pôr na mesa, com as escolhas que fazemos de mobilidade diária ou em férias, com a educação, com a saúde, com a cultura, com a justiça.
Só alcançando condições de vida digna para todos seremos capazes de dar continuidade aos tão urgentes planos de mitigação e adaptação às alterações climáticas, de lutar contra os grandes grupos económicos que usam as palavras Verde e Sustentável mas detêm as licenças que lhes permitem cometer as maiores atrocidades ambientais.
São claras as nossas posições, sabemos de que lado estamos, procuramos conhecer as questões, andar no terreno e definir orientações baseadas no bem comum. Queremos ser eleitos quando nos candidatamos, contudo, o nosso trabalho de todos os dias não é focado no voto das próximas eleições. Até porque todos conhecemos os altos e baixos que temos vivido em termos governamentais.
E mais uma vez e em tempo de discussão do Orçamento do Estado, percebemos que a preocupação do Governo AD é a de continuar a encher os bolsos de alguns, sem se preocupar com o reforço dos serviços públicos, sem se preocupar com as questões da habitação, sem querer dar resposta aos problemas dos animais de companhia e continuidade a campanhas tão importantes como a da esterilização dos animais de rua. Um primeiro-ministro que até ver, porque já saíram vários comunicados erráticos, que não se fará representar na COP29 demonstrando o pouco interesse nos assuntos sobre o ambiente e o clima.
Nada nos surpreende já que este Governo foi incapaz de defender o Lobo Ibérico na União Europeia sendo cúmplice nos passos atrás que se deram relativamente à proteção desta espécie, que pela mão dos Verdes alcançou esse estatuto. Nada nos surpreende de um Governo que não torna público os acordos com os Espanhóis sobre a água.
E já fiz referência à COP 29, que decorre nestas duas semanas, no Azerbaijão, esse espaço de debate e de reflexão em que os líderes mundiais deveriam prestar contas sobres os compromissos assumidos no Acordo de Paris e apontar novas metas e objectivos. No entanto, as cimeiras vão se sucedendo e os resultados deixam muito a desejar. Os mega interesses económicos dos sectores energéticos e outros impõem-se sobre a aprovação de medidas e meios concretos para mitigar as alterações climáticas, ajudar no processo de adaptação e salvar milhares de vidas.
Os grandes interesses económicos não se preocupam nem com a destruição da natureza, nem com as consequências que daí advém para os territórios e para as populações.
Só em 2024 assistimos a inúmeros fenómenos climáticos extremos, os incêndios que destroem a vida selvagem no Pantanal, no Brasil, estima-se que no primeiro semestre de 2024 tenham ardido 2,3 milhões de hectares.
Fortes ondas de calor, na Índia, em Nova Deli, as temperaturas atingiram os 49,9 graus Celsius, na Arábia Saudita atingiram os 50 graus Celsius.
Ondas de calor e a seca foram as condições ideais para os fogos florestais na Califórnia e nos EUA que obrigaram mais de 10 mil pessoas a abandonar as suas casas.
As cheias no Norte de África, uma região conhecida pela suas zonas áridas, registaram em Setembro uma precipitação 5 vezes superior à média esperada.
Segundo o Programa Alimentar Mundial das Nações Unidas mais de 4 milhões de pessoas, em 14 países, foram afetadas.
A tempestade Boris foi responsável por muitas inundações.
Os incêndios em Portugal voltaram a ter uma dimensão trágica, apesar de nos terem anunciado que depois de 2017 estava tudo resolvido.
Nestas semanas assistimos, horrorizados às consequências horríveis das chuvas torrenciais em Valência, devemos por isso tirar lições.
As secas e as inundações, as mudanças climáticas não são de hoje, já as conhecemos e estamos todos conscientes das suas consequências devastadoras com repercussões no presente no futuro.
Por isso, o Partido Ecologista Os Verdes há muito defende a execução dos planos, o cumprimento das metas e o investimento para serem colocadas em prática. Há anos que se aprovaram os Plano de Ordenamento da Orla Costeira, com exceção da Madeira que em violação da Lei continua sem Plano aprovado,
Continuamos a alertar para que não se construa em cima de linhas de água ou em leito de cheia, mas apesar das lutas e contestação dos moradores que contaram com o apoio dos Verdes, a Câmara de Braga insistiu em licenciar um ginásio e uma piscina privada numa zona repleta de linhas de àgua, perto das Sete Fontes. Também este património hidrográfico continua a ser uma luta dos Verdes que não largamos há décadas e não deixamos esquecer que a promessa é preservar aquele património e transformá-lo num Parque para o usufruto de todos.
Lutamos pela reversão da privatização da água aqui em Setúbal e essa luta foi vitoriosa, somos contra a privatização de um bem essencial e vital, que está a ser ameaçado pela forma como está a ser tratado. Por uns a água é tratada como um recurso que pode dar lucro, por outros é tida como um bem de luxo que escasseia a cada ano que passa.
E no que se refere à água muitas foram as campanhas, as propostas, as iniciativas que Os Verdes promoveram. Em 2022 fizemos o Roteiro da água no Alentejo e no Algarve, ouvindo associações, visitando barragens, conversando com as populações e os agricultores.
Estamos conscientes que a necessidade de dessalinizadoras poderá acontecer no futuro, contudo, não compreendemos como é que a opção passa por construi-las apenas porque temos dinheiro do PRR, sem que se apliquem as medidas já há muito identificadas. A água com gestão pública, o uso para rega revisto, a construção e requalificação de ETAR’s, a requalificação de redes de abastecimento.
Com a campanha SOS Natureza que o Partido Ecologista Os Verdes levou para a rua, colocamos bandeiras negras do Norte ao Sul do país assinalando os problemas ambientais.
Assinalamos problemas que identificamos durante décadas e que ainda não estão resolvidos. Os rios poluídos, as recuperações ambientais que ficaram por fazer como no Parque de Montesinho ou em Vila Nova de Cerveira onde a recuperação ambiental da antiga mina de volfrâmio, que encerrou nos anos 80, deixa muito a desejar pelos impactos da sua degradação.
Minas que apesar de milhões investidos na sua recuperação, passados tantos anos continuam a suscitar preocupações às populações. Que continuam a degradar os lençóis de água, que colocam em causa a segurança e a saúde de quem lá vive. Algumas das quais no coração de áreas classificadas.
Minas que agora querem abrir em territórios com um património natural reconhecido internacionalmente, como no caso de Montalegre e Boticas, mas também podíamos referir a mais recente intenção de prospeção de minerais no Parque de Montesinho. Todos estes territórios já pagaram e continuam a pagar bem caro uma dívida que nunca contraíram. Pagaram com o encerramento de linhas férreas, com o isolamento, com o encerramento de serviços públicos, de escolas, dos CTT, dos centros de saúde. Pagam com a falta de transportes públicos que muitas vezes só existem no período escolar e noutros casos nem isso.
Estamos firmes no caminho da garantia do direito de mobilidade para todo o país sem desigualdades de acesso. É preciso mais investimento na Ferrovia, levando o comboio a todas as capitais de distrito. É urgente que todos tenham acesso a um passe intermodal a preços acessíveis, como já acontece nas áreas metropolitanas, à custa de muita insistência e persistência em propostas sucessivas dos Verdes porque sabíamos que retirar milhares de carros das nossas estradas seria, e foi a medida mais amiga do Ambiente.
Companheiros, temos um património de décadas de trabalho, que agradecemos a todos os que iniciaram este projeto há mais de 4 décadas, que nos definem como um partido de resistência, de luta, de entrega, de compromisso, um partido que se iniciou com iniciativas reconhecidamente por todos, pela forte criatividade e pela felicidade, e que continuam a pautar a nossa intervenção aos dias de hoje.
Por isso, a todo os delegados, mas sobretudo aos jovens delegados, pedimos que conheçam esse património e que permaneçam audazes e criativos na forma de comunicar e de trabalhar, tenham sempre presente que só trazemos pessoas para o nosso grande coletivo, se estivermos motivados, se mostrarmos entrega e se o fizermos com alegria que sempre nos caracterizou.
E aqui em Setúbal não posso deixar de fazer uma singela homenagem a Sebastião da Gama, relembrando as suas palavras, nas quais nos revemos, como ponto de partida neste início dos trabalhos:
*O Sonho*
“Pelo Sonho é que vamos,
comovidos e mudos.
Chegamos? Não chegamos?
Haja ou não haja frutos,
pelo sonho é que vamos.
Basta a fé no que temos,
Basta a esperança naquilo
que talvez não teremos.
Basta que a alma demos,
com a mesma alegria,
ao que desconhecemos
e do que é do dia-a-dia.
Chegamos? Não chegamos?
– Partimos. Vamos. Somos.”
Somos os que acreditamos que é possível defendermos a nossa Casa Comum, o planeta Terra, dando respostas concretas ao declínio da biodiversidade, à emergência climática em conjunto com o desenvolvimento social e económico.
Somos os que não baixamos os braços e sem tréguas lutamos por direitos iguais, para a igualdade no direito ao trabalho, sem diferenças salariais, combatendo, a precariedade e os horários desregulados.
Somos os que não permitimos que se dêem passos atrás e lutamos contra as discriminações e contra os discursos de ódio.
Somos os que não se cansam de acreditar que a Paz no Mundo é possível e não desistiremos dela.
Somos os herdeiros de todos os que acreditaram e contribuíram para a Revolução, e passados 50 anos, afirmamos que não abdicamos de Abril, que não abdicamos da Liberdade.
Na 16ª Convenção do Partido Ecologista Os Verdes pretendemos deixar delineados os caminhos e olhar para o futuro, com a certeza que vamos continuar a exigir dos responsáveis mais e melhores opções políticas para a proteção do ambiente, dos animais, mais e melhor para a vida das pessoas, mais e melhor para o Futuro.
Bom trabalho a todos.
Viva o Partido Ecologista Os Verdes!